Conheça as três meninas pioneiras que jogam em uma equipe com 45 meninos

Angélica Spengler/AG

O sonho de Laura Müller, 10 anos era muito parecido com o de gigantes do futebol. Marta, Cristiane, Formiga. O crescimento suado do futebol feminino ajudou a pequena de apenas dez anos a moldar a paixão pelos gramados. Mas não parecia fácil para uma campo-bonense apaixonada por futebol, sem um time feminino que a encaixasse. Escolheu derrubar as mesmas barreiras que Marta, Cristiane e Formiga. Hoje faz parte da Escola de Futebol mista do Clube 15 de Novembro, onde ela, a pequena Laura, foi a pioneira em campo. Na última semana de agosto, quando foi apresentada aos 45 colegas de equipe, ela era a única menina no time. Cenário que mudou rapidamente. Uma semana depois, mais uma garota entrava para equipe, Amanda Monteiro, 10 anos. Dias após Samyra Weber, 14 anos, vestia a camisa do clube quinzista. E a história não para por aí, porque as gurias do 15 querem mais. Querem muito mais. “Eu só quero jogar bola e que o futebol feminino cresça. Não é nada demais. A gente só quer jogar, simples assim”, comentou Laura.

No Vale do Sinos atualmente não existem equipes de futebol de campo feminino nestas categorias, entrave que muitas vezes dificulta a descoberta de novos talentos. Devido à baixa procura, a criação de um time de garotas está longe da realidade atual de Campo Bom, mas para suprir a demanda, das até então poucas interessadas pelo esporte o 15 de Novembro começou a disponibilizar uma alternativa: a equipe mista. “Ano passado apenas duas gurias se inscreveram para participar da escola de futebol. Uma delas era a Laura e já no primeiro treino a outra menina desistiu. Este ano o Clube 15 de Novembro e o Departamento de Futebol inovaram e meninos e meninas irão treinar lado a lado. Nosso objetivo, além de formar grandes craques é também formar pessoas, respeitando o limite de cada um”, explicou Roger Lamba, Coordenador da Escola de Futebol.

Futebol também é “coisa” para meninas

— Quando crescer, quero ser jogadora de futebol!

A resposta foi comum entre as três meninas entrevistadas e que integram a escolinha de futebol do 15 de Novembro, ao serem perguntadas sobre o seu futuro. O sonho é o mesmo e a inspiração também: Marta, a melhor do mundo. “Não vai ter uma Marta para sempre”, alertou a jogadora após último jogo da seleção brasileira na Copa do Mundo de 2019. Após a eliminação do Brasil no torneio feminino com maior visibilidade da história, a artilheira pedia mais incentivo à modalidade, que enfim parece chamar atenção. Incentivo e oportunidade que as meninas do 15 também desejam neste ramo ainda tão masculino e cheio de tabus. “A questão que precisa ser resolvida para que o futebol feminino ganhe força é o estímulo. Ele precisa partir de casa, da escola. Nós somos dotados de múltiplas inteligências, então a menina tem a mesma capacidade de jogar do que o menino”, afirma Lamba.

E elas não se incomodam com as pessoas que acham que o esporte é coisa de menino: “Bobagem, meninas jogam muito bem”. Olhando de longe é fácil se confundir. Os dribles, a agilidade, a competência de colocar a bola no gol e as “malandragens” não permitem que se identifique logo de cara as garotas jogando futebol entre os garotos. A diferença em campo são as unhas mais cuidadas e o cabelo arrumado. Afinal as meninas fazem questão de se sentirem bonitas, mas em nada isso diminui a garra e a determinação delas. “As gurias nos surpreendem, caem, se machucam e logo estão correndo outra vez”, revela Roger.

Incentivo que vem de berço

Filha de Ivania Weber, 36, goleira da equipe de futsal Boleiras, que está disputando o Campeonato Municipal de Futsal Feminino, Samyra sempre esteve em contato com a bola. Inicialmente nas quadras, acompanhando a mãe, anos mais tarde a vontade de jogar futebol de campo falou mais alto e com o apoio de sua fiel escudeira e incentivadora a moradora do bairro Paulista está lutando pelo seu sonho. “Quando a gente faz alguma coisa com amor fica bem feito. O futebol é uma paixão e estar aqui é estar um pouquinho mais próxima de realizar”, comentou Samyra. A mamãe coruja acompanha todos os treinos no Estádio Sady Schmidt e não poupa elogios para filha. “Ela nasceu com a bola nos pés, tem habilidade e facilidade, o que me enche de orgulho. E agora com a possibilidade de treinar em um time, que vai contribuir para a formação técnica e profissional dela, sei que era o incentivo que faltava”, disse Ivania.

A mãe conta que a paixão de Samyra pelo futebol incentivou até o irmão mais novo, Heitor, de 9 anos. “Ele começou a gostar de futebol porque a irmã sempre o chamava pra bater bola, ele se interessou tanto que hoje também treina no 15, junto com a irmã”, conta a mãe.

Com apenas dez anos, Amanda Monteiro também já deixa o brilho no olhar falar mais alto quando se refere ao futebol. Segundo ela, o esporte é importante na sua vida desde os quatro anos. “Faz bastante tempo que jogo futebol, jogo na escola com os meninos e já joguei futsal também” diz a jovem atleta que sonha em ser atacante.

A mãe de Amanda era outra torcedora que acompanhava o treino da equipe na última terça-feira, 10. Marilene Monteiro traz a filha de Novo Hamburgo duas vezes por semana para treinar no clube campo-bonense. “No início, as meninas tentam ingressar num mundo em que são minoria. Não é fácil, mas é muito do estímulo. A chave está aí: percebermos que o futebol feminino precisa de uma atenção e um cuidado maior, porque às vezes tu podes ter um talento em casa não é?! O meu talento está lá”, emocionou-se Marilene.

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