Passos para uma cidade mais inclusiva

Angélica Spengler/AG

Por Giordanna Vallejos

Em caminhada pelas calçadas de Campo Bom, Helena Maria dos Santos traz a sua opinião sobre a cidade

Você se imagina caminhando pelas ruas, calçadas e avenidas de Campo Bom sem poder enxergar absolutamente nada? Essa é a realidade da campo-bonense Helena Maria dos Santos, de 66 anos, e de tantas outras pessoas com perda total ou parcial da visão. Nesta matéria, a equipe do Jornal A Gazeta realizou uma caminhada ao lado de Helena, que trouxe os impasses, elogios e ideias para melhorar a qualidade de vida na cidade, para as pessoas com deficiência visual.

Durante a tarde, o percurso começou no Centro da cidade, em frente à Igreja Católica. Ao descer do carro, Helena faz uma crítica construtiva em relação ao piso tátil, que na opinião dela é útil, mas que em alguns locais da cidade, está mal posicionado ou é muito estreito. “Colocaram o piso tátil, mas poderiam ter ido falar comigo ou com outra pessoa com deficiência visual para perguntar onde colocar. Se for caminhar para o lado próximo à rua, tudo que é árvore vai bater na cabeça. Por isso que tinham que colocar mais para perto do lado das lojas. Fico do lado do piso tátil para caminhar, não em cima dele”, explicou Helena.

Obstrução das calçadas

Em todo o trajeto realizado pelas ruas, por diversas vezes Helena bateu em placas, banners de lojas, cadeiras e entulhos. Um comerciante, ao perceber a dificuldade dela, devido à obstrução da calçada com entulho, na mesma hora retirou as madeiras do local. “Isso é proibido, a calçada é passeio livre, não pode ter vasos, não pode ter bicicletas, carros, não pode ter propaganda, nada. Está no livro da constituição”, relata. Apesar de não ser indicado, as placas no estilo bandeira, se mostraram menos danosas do que as de metal.

Durante a conversa, ela sugeriu uma ideia para a melhora na locomoção na cidade. “Os bicicletários são todos em cima das calçadas. Mas se eles pintam no chão onde pode estacionar as motos na rua, porque eles não pintam na rua também, para as bicicletas e colocam o bicicletário lá? Porque isso afeta eu, quem está de cadeira de rodas, mãe com bebê, pessoas de idade, sobrando um pedaço muito pequeno da calçada para fazer a passagem”, explica.

Preconceito e desinformação

No meio do caminho, ela decide se guiar sem o piso e relembra momentos em que sofreu preconceito por sua condição. “Sempre caminho batendo nas laterais de lojas, muros e casas, para não arriscar cair na rua ou ficar presa nas árvores. Mas às vezes bato com a bengala em carros estacionados. Um dia tinha um monte de carros e um homem veio correndo e eu pensei que ele queria me ajudar. Daí explicou que não queria que eu arranhasse o carro zero dele com a bengala. A bengala não estraga nada, é feita de fibra óptica justamente por isso”.

Helena também revela que deixou de usar notas de dinheiro, porque algumas pessoas, ao perceberem que ela é cega, davam o troco errado, se aproveitando da situação. Além disso, ela conta que muitos na rua agem como se a deficiência visual fosse algo contagioso e evitam tocá-la, mesmo quando ela pede ajuda para atravessar a rua. “Uma vez peguei um táxi, deu R$ 11 e eu dei R$ 50, ele me devolveu R$ 13. O que importa não é o valor do dinheiro, mas usar da minha impotência para roubar”.

Um acidente que mudou tudo

“Eu tive um acidente de moto, fui internada e peguei meningite, a febre queimou o nervo óptico no olho. Na época eu tinha 31 anos, estou há 31 anos sem enxergar. Foi consequência de um acidente e de uma negligência hospitalar”, explica. Depois disso, ela precisou passar por uma reabilitação para aprender a viver sem enxergar. Helena conta que o processo foi bem difícil e que já caiu em buracos nas ruas da cidade. “Eu estava me preparando para fazer faculdade, ser mãe, casar, cuidar de uma casa, e tudo isso foi amputado na minha vida”.

O benefício do piso tátil

“Mas assim fica fácil caminhar, com esse piso tátil. Aqui é tudo moleza para achar o piso. Aqui a calçada é boa, não tem obstáculos ou bocas de lobo”, disse ela ao andar nos arredores do Clube Oriente, no Centro da cidade, elogiando a qualidade do trecho em particular. O local conta com um piso tátil mais largo e com o relevo mais profundo, no qual ela consegue andar em linha reta, sem se desviar para a rua ou para as entradas das lojas.

Ajude Helena a voltar a ler

Helena pede ajuda da comunidade, para poder comprar os óculos inteligente, que possibilita a leitura de notas de dinheiro, reconhecimento facial, leitura de livros, rótulos e entre outras coisas para pessoas com deficiência visual, por meio do dispositivo inteligente, que faz a leitura e emite o som com as palavras do objeto. Isso a ajudaria a reconhecer com quem está falando nas ruas ou até mesmo, evitar ser enganada com notas erradas de dinheiro. Ela também conta que ama ler livros e que poder novamente ler exemplares no papel, mudaria a vida dela. Para ajudar, basta clicar aqui.

Hora de atravessar a rua

Helena sabe alguns locais em que existem faixas de segurança em Campo Bom. Ao chegar nesses locais, ela atravessa usando a audição como sua maior aliada. Quando não se sente preparada, às vezes solicita que alguém a ajude na travessia. “Muitos carros não respeitam a faixa de segurança. Nos dias com vento forte, eu não consigo caminhar na rua, porque o vento tira toda a audição que eu preciso para atravessar, tudo que é barulho forte atrapalha”.

Para ela, uma das maiores dificuldades ao sair de casa são os semáforos em ruas movimentadas, sem sinaleiras de pedestres, que emitem um som quando a travessia é segura. Desprovida deste recurso, ela não consegue ter a segurança de saber se o sinal está verde, vermelho ou amarelo e sugere o aumento destes semáforos de pedestres, para amenizar o impasse para os deficientes visuais.

O que diz a prefeitura

A Prefeitura, buscando melhorar a segurança dos pedestres que circulam pelo município, segue trabalhando na manutenção dos atuais passeios públicos e investindo na construção e revitalização de espaços já existentes.
Um exemplo é o passeio construído no Bairro Celeste, na Avenida São Leopoldo, entre a Av. Gustavo Vetter e a rua Dolores Alcaraz Caldas. Devido ao forte aclive presente no local e a falta de um espaço para os pedestres caminharem, eles eram obrigados a invadir o espaço da avenida e ficarem expostos a acidentes de trânsito. Com a obra realizada, foi possível dar a segurança necessária para os pedestres.
Outra obra realizada é a calçada da Avenida Kennedy – num trecho de 450 metros, ligando o bairro Metzler com o Loteamento Firenze, antes uma área com matagal e barro e agora uma convidativa calçada para caminhadas.
Com relação às pessoas com deficiência visual, todos os novos projetos e revitalizações realizadas pela gestão incluem o piso tátil. São exemplos o Largo Irmãos Vetter, a UBS 25 de Julho, o Centro de Convivência do Idoso, o Novo Parcão e muito mais. A Prefeitura se preocupa em garantir a segurança aos pedestres, independentemente de sua condição.
“A inclusão de todos os públicos está sendo feita em cada espaço que estamos construindo ou revitalizando em Campo Bom. Sabemos da importância de ouvir, respeitar e dialogar sobre o tema, e do quanto ainda temos que trilhar para chegar num modelo ideal. Já avançamos e seguimos trabalhando com olhar atento na promoção de melhorias que facilitem a mobilidade urbana”, destaca o prefeito Luciano Orsi.

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