Erradicação da paralisia infantil e a missão contínua da vacinação

Giordanna Vallejos/AG

Médica que testemunhou a erradicação da poliomielite no Brasil compartilha suas lembranças e alerta sobre a importância contínua da vacinação

Por Giordanna Vallejos

No ano de 1986, um movimento uniu a sociedade brasileira em torno de um objetivo grandioso: erradicar o vírus da poliomielite. Em Campo Bom, não foi diferente. Por isso, na capa da primeira edição do Jornal A Gazeta, estava estampada uma matéria sobre a vacinação de 7056 crianças contra a poliomielite, conhecida como paralisia infantil.

Esse movimento de erradicação da doença nas Américas foi promovido pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), e foi um sucesso.

Marlene Loide Arais, médica com 71 anos e muitos anos de vivência na área da saúde, relembra a época em que as campanhas de vacinação eram um movimento comunitário fervoroso. Em uma conversa franca, a doutora compartilhou suas lembranças e opinou sobre o panorama atual da vacinação no Brasil.

Em busca da erradicação

Na década de 1980, a Opas propôs a erradicação da poliomielite nas Américas, um desafio ambicioso que mobilizou todos os cantos do Brasil. Marlene recorda a atmosfera da época: “Era um movimento da cidade inteira. Tinha um respeito da sociedade em levar aquela criança para vacinar. Inclusive, festas comunitárias eram organizadas após alguns eventos de vacinação”. As campanhas de vacinação eram uma prioridade, e a participação das pessoas era um reflexo do entendimento sobre a gravidade das doenças e suas sequelas.

Marlene relembra que, em Campo Bom, por muitos anos, a campanha era realizada com a colaboração de voluntários em locais públicos. Ela narra como percorria as estradas para levar a vacinação até as áreas mais remotas, compartilhando as memórias de um tempo em que a vacinação era uma ação comunitária. “Ganhei uma menção honrosa do Rotary justamente por participar da campanha de erradicação da poliomelite no Brasil.” Atualmente, as famosas “gotinhas” são aplicadas nos postos de saúde do município.

Impactos da doença

No entanto, Marlene observa que a percepção da importância da vacinação mudou ao longo dos anos. O sucesso das campanhas de erradicação fez com que muitas pessoas subestimassem o impacto das doenças evitáveis por vacinas. Ela lamenta a banalização e a falta de valorização das imunizações, mesmo diante das evidências históricas. “As pessoas esquecem o quão mal fazia essa doença, a importância da vacina, quando não se vê mais as vítimas disso”.

A médica explica que a poliomielite causava uma paralisia de membros inferiores. Dessa forma, muitas crianças cresciam com sequelas como não conseguir andar, ou dificuldades de locomoção que persistem por toda a vida. “Imagina uma criança que não consegue correr, não consegue brincar. Muitas vezes, dependendo da virulência, podia acarretar outros comprometimentos pulmonares neurológicos”, relembra ela.

O legado do Rotary Internacional

Em 1979, o Rotary Internacional deu início a uma Campanha Global de Erradicação da Poliomielite. Os Clubes do mundo inteiro abraçaram a causa, auxiliando na vacinação em suas cidades. Essa colaboração também foi essencial para o sucesso das campanhas.

Apesar dos avanços, o desafio persiste. Em 2022, foram identificados casos no Afeganistão e no Paquistão, países que não permitiram a entrada da vacinação por questões religiosas. Enquanto houver um caso de poliomielite, o mundo inteiro corre o risco do retorno da doença. Estudos indicam que se a campanha parasse hoje, em 10 anos a doença poderia paralisar até 200 mil crianças por ano. O Rotary Internacional já doou mais de 2,1 bilhões de dólares e incontáveis horas de trabalho para proteger as crianças.

LEIA A REPORTAGEM DE 1986

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